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Igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens, em Coqueiro Seco, é tombada definitivamente como Patrimônio Imaterial do Brasil
A Igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens, em Coqueiro Seco (AL), foi tombada definitivamente nesta quinta-feira (9), na 104ª Reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, sendo inscrita no Livro do Tombo das Belas Artes e no Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. A dupla inscrição do bem se justifica por sua qualidade artística singular, expressada nas soluções arquitetônicas e na combinação do estilo rococó e neoclassicista, assim como por sua interação com o ambiente natural e seu impacto urbano. A edificação havia recebido em 2011 o tombamento provisório, faltando apenas a aprovação do conselho para a inscrição permanente.
Localizada no alto de um morro e visível desde a Lagoa Mundaú, para a qual está voltada, a igreja começou a ser erguida a partir da doação de terras por parte de moradores locais em 1790, quando Alagoas ainda integrava a capitania de Pernambuco, e foi finalizada nos primeiros anos do século XIX, sendo importante memória da ocupação católica na época do Brasil Colônia. "Um sentimento de dever cumprido com nosso povo. Representa uma conquista de todos que, certamente, será um divisor de águas para a nossa cultura, o turismo e, claro, o fomento da economia do município. Nossa equipe deu o máximo para que esse reconhecimento acontecesse", destaca a prefeita Decele Dâmaso.
Destaca-se que sua construção também teve contribuição dos habitantes locais e foi realizada em etapas. Já em 1792, a capela estava pronta, sendo o passo seguinte a ornamentação com elementos artísticos em seu interior. No começo do século XIX, foram finalizadas a fachada principal e as duas torres sineiras. Em seguida, vieram o adro monumental (terreno em frente à igreja que a separa das demais edificações da cidade e servia como local de encontro e atividades dos fiéis) e três sinos de bronze, dispostos na torre direita.
O tombamento é de alto significado para a cidade alagoana, que tem Nossa Senhora Mãe dos Homens como sua padroeira, exaltada na região anualmente no último domingo de janeiro com festejos, procissões e missas. A devoção a essa representação de Nossa Senhora foi trazida de Portugal e iniciada em Minas Gerais, antes de chegar a Alagoas. Conforme pesquisa realizada durante o processo de reconhecimento da Igreja como Patrimônio Cultural do Brasil, a imagem de Nossa Senhora Mãe dos Homens, esculpida em madeira dourada, está na edificação desde 1791. Segurando o Menino Jesus no braço esquerdo e abençoando aos fiéis com a mão direita, Maria está representada em uma escultura de aproximadamente 1,40m. "O tombamento federal definitivo representa para a cultura coqueirense um reconhecimento de grande valor e relevância cultural para o patrimônio histórico artístico e cultural do município, do Estado e do Brasil, fortalecendo a preservação do bem, suas artes integradas e a referência religiosa nas diversas manifestações imateriais do povo do lugar", destaca Jô Rodrigues, secretária Municipal da Cultura.
Integração entre igreja, paisagem e cidade
Destaque turístico e de relevância socioeconômica para o estado de Alagoas, a Lagoa Mundaú, que se estende da capital Maceió e alcança as cidades de Santa Luzia do Norte e Coqueiro Seco até encontrar o oceano Atlântico, permitiu o florescimento de uma cultura ribeirinha na região, baseada especialmente na pesca do sururu, iguaria de destaque local até hoje.
O transporte lacustre também foi um traço marcante de Coqueiro Seco, sendo um meio de chegada e saída da cidade. Nesse sentido, os modos de vida e ocupação emergentes daquela paisagem constituída pela vegetação, especialmente de coqueiros, e pela lagoa foram determinantes para orientar a construção integrada da Igreja, que foi erguida exatamente virada para a Lagoa Mundaú, podendo assim ser avistada à distância por sua localização privilegiada no alto de um morro e a cerca de 200 metros da orla da lagoa.
Do mesmo modo, a edificação da Igreja no alto do morro, em posição destacada, como era comum na ordenação urbana católica, transformou o sentido da urbanização da cidade, na medida em que os espaços religiosos tinham protagonismo na vida social. Se anteriormente as pequenas casas ocuparam as margens da lagoa, após a implantação da Igreja, a cidade cresceu monte acima e a envolveu.
"[...] a valorização dos espaços sagrados - igrejas e capelas - transformava-os em pontos de atração para os quais convergia a população ávida pelo contato com aqueles locais onde, além da visibilidade arquitetônica e das questões religiosas a eles inerentes, lá eram estabelecidas importantes e necessárias atividades ligadas à sociabilidade", aponta o dossiê.
Assim, o valor paisagístico do bem ali instalado e integrado à topografia e ao modo de vida da cidade é uma das bases do tombamento, garantindo tanto a proteção da edificação quanto da sua área de entorno.
Excepcional por fora e por dentro
Ao subir as escadas em frente à Igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens, tem-se noção dos destaques mais evidentes da “excepcionalidade arquitetônica” do edifício: as influências rococó e neoclassicista e a frontaria azulejada, feita em meados do século XIX, características incomuns em monumentos religiosos no Nordeste do Brasil à época.
A técnica trazida de Portugal enfeita com azulejos em padrão floral as duas torres e o tímpano (parede decorativa acima da porta da Igreja, entre as duas torres) e é complementada com um embrechado, artifício de decoração que busca imitar a azulejaria tradicional a partir de cacos de cerâmica, conchas e pedras coloridas - uma solução encontrada pela arquitetura brasileira para problemas nas edificações da época e que torna a edificação singular na região naquele momento, aponta o parecer técnico.
Da porta para dentro, são elementos artísticos integrados, entalhados em madeira, que chamam a atenção. Retábulos, púlpitos, pia batismal, sanefas e tribunas em estilo rococó, uma fase mais suave do Barroco, assim como a imaginária e objetos litúrgicos. Tudo encomendado a entalhadores e artistas santeiros da Bahia, conforme relatos historiográficos, indicando a singularidade do bem cultural.
Apesar da perda parcial desses artefatos após desabamento do telhado em 1949, em consequência de uma tempestade, a Igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens manteve seu valor arquitetônico único, assegurando-lhe também a inscrição no Livro do Tombo das Belas Artes.
Fonte: Iphan